Mais um dia nesse imenso teatro
Que chamamos vida
Mais uma peça representada
No pequeno palco do tempo
Pegue os figurinos, vista-se
Hoje é dia de espetáculo
Prepare a maquiagem, use-a
Nada pode sair errado
Vamos, vista-se logo
Hoje é dia de representar um pai
Amoroso para sua esposa quando todos olham
E um carrasco fora da luz dos flashes
Não perca tempo, corra ao guarda-roupa
Também é dia de representar um filho
Educado e prestativo para os estranhos
Mas a réplica de um touro raivoso para seus pais
Amizades falsas, fingidas
Amores comprados
Um corpo leiloado
E vendido pelo melhor preço
Mais um dia nesse espetáculo
Que chamamos existência
Os anos são os atos
Os dias são as cenas
Não importa o quão vazias
Não importa o quão fúteis
Afinal, o importante é alegrar a platéia
Custe o preço que custar
Quedas disfarçadas
Defeitos eximiamente maquiados
Erros pintados como palhaços
A verdade coberta de lantejoulas
Debaixo das bolsas de couro
Das malas com dinheiros
Carros importados e cartões de créditos
Onde está o ator?
Não há vagas para os fracos
Ou para atores ruins
Muito menos para os honrados
Os justos, simples ou simplesmente verdadeiros
Mas, que mal se pergunte:
Quem nunca atuou?
Para os amigos, a família, a igreja
Quem nunca se maquiou?
Para esconder um deslize
Ou a possibilidade de um escândalo
Para ocular amores proibidos
Ou desejos desenfreados?
Que mal se pergunte outra vez:
Quem nunca fingiu?
Quem nunca mentiu?
Quem nunca chorou?
A palavra de ordem é esconder:
Quem sou, quem fui e quem quero ser
Vestir as roupas do que acham certo
E com elas, os adornos do aceitável
No meio de tantos mentirosos,
De meias-verdades
De tantos atores que os filmes perdem
A vida continua, a peça se prolonga
Porque o show vai sempre continuar
O show tem que continar
Não importa quantos figurinos se use
O show precisa continuar
Caio Blackwell
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